Esta banda finlandesa com integrantes da cidade de Vantaa, e progressiva por excelência, pegou emprestado o nome “KHATSATURJAN” como uma espécie de homenagem ao famoso compositor armênio que muito admiram.
Os quatro músicos que fundaram o grupo são todos talentosos tecladistas, multi – instrumentistas e cantores, e curiosamente colocam sempre a expressão “que também canta” na descrição de suas habilidades, mesmo que todos, à exceção de Jaako, cantem em corais.
O fato é que na verdade possuem belas vozes, bem treinadas, que soam especialmente impressionantes nos arranjos vocais que interpretam juntos.
São eles: Atte Kurri “O Letrista do Grupo, que toca Guitarras, Ukulele, Baixo, Percussão e Flauta” – Ilkka Saarikivi “Cello, e Percussão” – Ilkka Piispala “Bateria,Percussão e Baixo” e Jaakko Koikkalainen Baixo e Guitarra.
As influências citadas pelos membros do Khatsaturjan são muito abrangentes, e de certa forma muito perceptiveis em sua obra, para os ouvidos bem atentos: Pergolesi, Duran Duran, Chick Corea, Pat Metheny, Dimmu Borgir, Toto, Steve Reich, Mussorgski, Clannad, Yes, Kate Bush, Angra, Queen, Renaissance, Kansas, Symphony X, Van der Graaf Generator, Genesis, Mahavishnu Orchestra, Corelli, Bach, Rimski Korsakov, Debussy, Dream Theater, The Flower Kings, Prokofiev,Sibelius,Tori Amos, The Beatles, Astor Piazzolla, Nick Drake, Coldplay, Sigur Ros, Flaming Lips, Pink Floyd, Brahms, Shostakovich, Rautavaara, Rachmaninov, Dvorak, Sibelius entre outros.
Os integrantes do Khatsaturjan se conheciam muito tempo antes da formação do grupo e já haviam tocado juntos em combinações diversas enquanto estudantes.
No ano 2000 formaram uma banda para um par de shows em que tocaram obras clássicas em formato Prog, criando arranjos para composições de Dvorak, Mussorgsky e Prokofiev.
Depois de uma pequena pausa se reuniram novamente em 2001 e começaram a compor e ensaiar novos materiais.
Como resultado, gravaram um EP “Aramsome Sums” de forma independente entre julho e novembro de 2002 e lançado em 2003. 500 cópias apenas segundo apurei e distribuido apenas entre amigos e músicos, portanto uma raridade.
Este álbum inicial do Khatsaturjan possui cinco faixas originais e versões de “A Night On A Bare Mountain”, uma versão compacta de menos de três minutos do poema sinfônico de Modest Mussorgsk, que é uma composição dramática que inspirou músicos prog já nos anos setenta (The American Fireballet) e “A March To The Scaffold”, uma seção da Sinfonia Fantástica de Hector Berlioz
Entre o material original o destaque vai para “A Ballad of a Defector” que apresenta um belo violoncelo interpretado pelo tecladista principal Ilkka Saarikivi, “The Ultimate Nocturnal Transmissions”, uma excelente composição,com harmonias vocais, elegância clássica e flexibilidade jazzística e o épico de quatro partes “Astral Cycles in Motiongrace” em que já se ouve um pouco do aspecto humorístico desta banda que se repete em pequenas doses nos álbuns posteriores, uma nítida influencia de Frank Zappa.
O estilo deste álbum pode ser definido como um progressivo com forte destaque para o elemento sinfônico com muita influência da musica progressiva dos anos 70 incluindo o uso ativo do órgão Hammond, piano acústico e cordas,com destaque ao violoncelo, guitarra, baixo e percussão.
Já se nota neste álbum o que seria uma das principais marcas do grupo: a complexidade e as belas harmonias vocais com forte influência, e sem nada de plágio, do lado mais suave de Gentle Giant, que mais tarde foram levadas ao extremo em “Aramed Forces Of Simantipak”
O Khatsaturjan iniciou a gravação do primeiro álbum completo “Aramed Forces Of Simantipak” em junho de 2004 quando então já possuíam o dobro de material em comparação à época do primeiro projeto.
O repertório clássico foi abandonado de vez para que toda a música fosse completamente original. Um ano foi o tempo necessário para a conclusão da gravação.
Seguindo o exemplo de “Aramsome Sums” realizaram todo o trabalho, incluindo a produção, para que o álbum tivesse o resultado planejado. Peças corais, grande variedade de sintetizadores, cordas autênticas, guitarras em overdub …
Em poucas palavras: “Aramed Forces Of Simantipak” é um grandioso álbum de estréia e foi lançado pela Musea Records em junho de 2006.
Atte Kurri, o guitarrista, na época declarou: “As influências clássicas ainda são um ponto de partida importante, e agora fizemos arranjos maiores, incluindo também coro e cordas ”
A música deste álbum é de fato audaciosa e eclética, carregada de deliciosa complexidade e uma ampla dinâmica.
As partes que apresentam influência clássica nas estruturas de composição e arranjos são habilidosas. O épico intitulado “The Mass” tem uma seção em que o cravo toca uma melodia de Georg Friedrich Händel, acenando para o inicio da banda quando as peças clássicas era algo mais central.
Os vocais podem até parecer um pouco amadores para alguns, porém a forma ambiciosa como são utilizados merece aplausos. O prog aventureiro de Khatsaturjan combina um pouco do eclectismo de GENTLE GIANT, o humor de 10CC ou KLAATU, e a pompa do YES.
O som com muitas camadas é prioritariamente orientado para o teclado mas completamente livre de influencias de Keith Emerson e revestido por harmonias vocais. Felizmente há elementos bem mais pacíficos e acústicos que evitam a sensação de sobrecarga.
Este ainda não é uma obra-prima, mas um álbum de prog incrível e altamente energético!
Na primavera do mesmo ano o Khatsaturjan alugou uma sala de ensaios e finalmente conseguiu estar como uma banda completa em uma base regular, o que não havia sido possível anteriormente.
O Período que levaram até 2010, quando finalmente lançaram o segundo álbum “Disconcerto Grosso” é meio obscuro.
O que podemos imaginar é que levaram 4 anos na concepção deste álbum, que já é sensivelmente superior ao primeiro, ao menos em ousadia.
Este álbum, acredito, não foi muito bem compreendido pela critica “especializada” assim como o último, mas o que particularmente percebo é uma evolução mais do que natural no conceito das composições e dos arranjos que se tornam cada vez mais impressionantes e imprevisíveis.
O grande senso de humor prevalece como algo suave e natural, coisa rara de se ver hoje em dia.
As músicas são mais complexas , mais interessantes e melódicas, muito bem executadas e bem diversificadas, mesmo que às vezes familiares, com arranjos fabulosos e um trabalho vocal excepcionalmente agradável e incomum. Pode-se notar uma maior influência do Queen nos arranjos vocais.
Há pelo menos uma obra prima indiscutível “Herculean” que começa como uma peça instrumental, muitas vezes desconcertante e lírica, que logo se transforma com os vocais em uma montanha russa atmosférica, tecendo criticas às políticas mundiais no texto exuberante e “A Rhyme of a Dime”, outra faixa de destaque, que intercala harmonias vocais de opereta com cascatas agéis de piano e uma teatralidade ininterrupta e irônica.
Mais cinco anos e vêm a luz o melhor trabalho do Khatsaturjan “Beast, Machine & Man”. Aqui a impressão geral é que buscaram a perfeição sonora e conceitual.
Quase todas as faixas deste álbum desde a menor com 4 minutos até a maior com quase 12 minutos “In Pursuit Of A Haunting Singalong” estão repletas de mudanças e quebras de ritmo, que como já disse foram mal compreendidas ou não aceitas pela critica, muitas vezes se referindo a isto como “pequenas falhas na execução”.
Outros comentários infelizes se referem a uma espécie de retrocesso na troca(???) das influencias vocais em que teriam abandonado o Gentle Giant pelo Queen, um grupo menor declararam!
Ledo engano e incompreensão para um grupo que se reinventa constantemente alheio aos rótulos que a critica procura impor.
Eu considero este o melhor trabalho progressivo de 2015, o que não é pouco, se considerarmos que tivemos 852 álbuns progressivos lançados neste ano.
Jaakko Koikkalainen apesar de tocar neste álbum já não está mais na banda e foi substituído em algumas faixas por Matti Muraja que toca baixo (e violino).
A ambiciosa e inventiva musica prog desta banda e a deste álbum em particular é, em minha opinião, do mais alto nível mundial quando se fala da influência progressiva dos clássicos dos anos 70 aliada à uma criatividade e talento pessoal a toda prova.
Se este álbum viesse dos anos 70, hoje seria cultuado como um clássico, é o que penso.
O fato de todos os quatro membros cantarem e tocarem vários instrumentos é realmente muito revelador. As harmonias vocais são uma parte importante do som, e a música é muito flexível no arranjo e nas composições.
Piano, órgão e sintetizadores são todos bem presentes no som, que é colorido por violoncelo e violino. A mudança constante entre o acústico e o elétrico é realizada de uma maneira inesperada. Os vocais individuais ou em grupo são ótimos e expressivos.
A música que produzem é de tirar o fôlego e mesmo que o som evoque GENESIS, YES, GENTLE GIANT e QUEEN, só para citar alguns exemplos, devido à complexidade das partes vocais e instrumentais possui uma forte identidade pessoal com a inspiração e arranjos bem próximos à da musica clássica , musicais e óperas, no qual a instrumentação característica do progressivo acaba conferindo mais complexidade e força.
Na data da publicação original desta apresentação do Khatsaturjan abri um parênteses para destacar que não havia vídeos e entrevistas do grupo e que o web site do grupo se encontrava muito desatualizado e com links que não levavam a lugar nenhum, o que ainda é um fato. Comentava também que devido à periodicidade costumeira só veríamos um novo álbum deles provavelmente em 2020!
Porém depois disto consegui contato com o guitarrista Atte Kurri e em Outubro de 2017 um pouco antes de dedicar um programa “Momento Prog” ao Khatsaturjan em 19 deste mesmo mês, que aliás usa o tema da “Suite Phobia Utopia” como tema de abertura e encerramento gentilmente cedida por Atte, solicitei esclarecimentos adicionais sobre o projeto na época e sobre o futuro.
Segue os comentários de Atte Kurri sobre o Khatsaturjan:
O desenvolvimento do estilo e do som de Khatsaturjan
Nós éramos quatro caras jovens na faixa dos vinte anos de idade quando começamos, com boas ideias e mente aberta para tentar criar algo novo, ou pelo menos algo diferente do que os outros faziam.
Com nossos conhecimentos em estudos de música ao longo dos anos escolares, estávamos confiantes em possuir as ferramentas necessárias para fazê-la.
O núcleo da música de Khatsaturjan foi inicialmente enraizado em obras clássicas colocadas no contexto de rock, além disso, claro, fomos inspirados por lendárias bandas clássicas de prog.
Sempre quisemos experimentar vários estilos e tradições musicais, ter uma ampla escala de emoção, expressão e instrumentação. Nós gostamos dos elementos de surpresa e drama.
Colocamos um pouco de jazz, AOR, teatro musical … e outras coisas, aqui e ali. Cada membro compôs – um pouco mais, um pouco menos – mas todos trouxeram diferentes influências e ideias, que foram a chave para a produção de música versátil e com frequentes alterações.
Por um outro lado, o estilo e o som do Khatsaturjan se desenvolveu em parte devido ao infeliz fato de não termos a possibilidade real de tocar ao vivo por causa de nossas outras atividades e por sermos um pequeno grupo de 3 ou 4 membros ativos.
Então, pensamos que deveríamos nos concentrar em escrever e gravar grandes trabalhos progressivos com ótimos arranjos corais e orquestrais, combinando nossas diversas influências.
Utilizamos as possibilidades oferecidas por um estúdio caseiro, pois não podíamos fazer shows. No entanto, admito ter perdido a oportunidade da apresentação, o que agora tenho com nossa atual banda ativa “Cardiashow”!
De certa forma era algo similar a uma orquestra, embora fossem apenas poucos instrumentos na época.
Descobrimos que esta seria a melhor maneira de nos expressarmos musicalmente, então. Poderíamos explorar várias maneiras de colocar ideias complexas de composição, acrescentando formas e texturas.
Algumas de nossas músicas eram de comprimento e forma regulares, algumas eram hercúleas!
Muitas vezes eu tocava peças de guitarra em várias camadas (normal para prog) e possuíamos diferentes tipos de teclados modernos e vintage para a construção de nossa paisagem sonora – acima da base de bateria e baixo.
De vez em quando também usávamos violoncelo, violinos ou percussão melódica para colorir nossa música. E nós queríamos fazer muitas coisas com os vocais, então nos revezávamos nos vocais e cantávamos muitas harmonias. (Nós fomos, e ainda somos cantores de coro ativos).
Em nosso primeiro álbum nos comportamos como iniciantes realmente, especialmente no departamento vocal, mas desenvolver o nosso som pessoal e as harmonias de grupo ao longo dos anos foi divertido e inspirador! Acreditamos que nosso vocal eventualmente se tornou uma parte integrante do nosso prog!
As letras eram sempre a parte mais difícil. Eu fui o único escritor nos últimos dois álbuns. Meus temas variavam, e fiquei fascinado pela fonética, rima e forma como tal.
Eu tentei ser inteligente na concepção das letras, eu meio que senti estar escrevendo prog de forma lírica também, o que é um pouco ingênuo, é claro! Nem sempre foi fácil expressar-me livremente dentro dessas letras e não ser apenas técnico, especialmente para um não-nativo como eu.
Às vezes eu ainda conseguia falar minha mente e meu coração.
Projetos atuais e futuros
No momento, não há planos de curto prazo para novos álbuns do Khatsaturjan, mas é certo estarmos confiantes que trabalhemos em um novo projeto mais tarde.
Ilkka Saarikivi e eu atualmente estamos tocando no grupo “Cardiashow” com excelentes músicos, fazendo uma música legal e ambiciosa novamente, mas com a diferença de realmente ser um grupo ao vivo agora.
Os últimos dois projetos de álbuns do Khatsaturjan foram muito lentos e levaram anos em sua conclusão. Principalmente devido aos arranjos colossais e à enorme quantidade de trilhas de vocais e de instrumentos.
Também devido a outras responsabilidades que tínhamos. Simplesmente não fomos ativos e eficientes no agendamento das sessões. Além disso, enquanto que fazíamos as sessões vocais juntos, gravamos todos os instrumentos individualmente em nossas casas.
E, como um simples projeto de estúdio, não ensaiavámos como um grupo … e eu meio que me perdi e desejei uma maneira mais ativa e social de fazer nossa própria música. Tocar ao vivo no palco foi uma ótima oportunidade de mudança!
“Cardiashow” foi fundada quando o nosso vocalista (e um companheiro de coro de Ilkka) ouviu a música de Khatsaturjan, gostou e propôs a união de forças.
Nós conseguimos um baixista e baterista e começamos a ensaiar no início de 2016. Nosso material é influenciado pelo prog e pelo rock clássico, cantamos muitas e muitas harmonias vocais.
Até agora fizemos dois shows ao vivo em Helsinki e estamos planejando mais em futuro muito próximo. Uma gravação de estúdio também se encontra em tentativas de negociação.
“Cardiashow” tem uma página no Facebook, https://www.facebook.com/cardiashow/ com vários clipes ao vivo e de ensaio para apreciação!
Convido todos a conhecer!
Atte Kurri
Como não associar este grupo como sendo um dos mais inovadores dentro do prog atual?
A música deles é do tipo que nunca se torna cansativa e um dos motivos para isto é o fato dos escandinavos compreenderem em outro nível a manipulação das cores das notas musicais e possuírem diferentes recursos estilísticos que conduzem muitas vezes ao inesperado.
O Khatsaturjan tendo produzido um EP e três fabulosos álbuns Projeto em Estúdio no qual utilizaram todos os recursos possíveis aliado à uma criatividade inquestionável se torna a partir deste conceito, a meu ver, uma das forças principais da cena finlandesa no progressivo atual. Isto para não dizer da cena mundial!
Ligações Externas
Khatsaturjan em Pro(G)ject New Progressive Works
Excelente resenha sobre um das mais destacadas bandas do Progressivo atual, com três belos trabalhos lançados de muita qualidade. Valeu Vinício, sucesso!!!
Concordo com voce Marcelo Moura e por isto fiz questão de que este grupo fossse um dos primeiros assuntos do blog. Estou tentando um contato com eles porque acredito que estão prestas a vir com algo novo. Sexto sentido talvez? Forte abraço caro amigo.